Eventos que reúnem profundos conhecedores da matéria de que tratam costumam apontar caminhos com muita clareza. É com certeza o caso do 12º Encontro Nacional de Advogados das Entidades Fechadas de Previdência Complementar – ENAPC, que viveu ontem o seu segundo e último dia em São Paulo, quando na plenária sobre “Relações Jurídicas na Previdência Complementar: Autonomia Contratual da Adesão ao Plano de Benefícios” se discutiu principalmente o direito adquirido aplicado à previdência complementar fechada. Os dois expositores apontaram em igual direção, a mesma aliás da jurisprudência do STJ e, segundo muitos, a que melhor traduz o entendimento da lei.
O professor Carlos Alberto Carmona destacou a importância da Mediação e Conciliação, prevista no Código de Processo Civil, pouco utilizada e que poderia ajudar em muito as partes na solução de conflitos.
A direção apontada foi uma só: o direito adquirido só passa a ser visto como tal a partir do momento em que o participante preenche todas as condições de elegibilidade ao benefício.
Importante, mas insuficiente – Daniel Pulino, professor de Direito da PUC-SP e Procurador no Escritório de Supervisão da Previc em São Paulo, notou que a manifestação de vontade expressa através da assinatura do contrato de adesão ao plano continua obviamente sendo importante, mas é insuficiente para se opor às alterações feitas no regulamento ao longo do tempo para garantir a estabilidade atuarial e que desse modo se aplicam a todos indistintamente.
Mesmo porque, acrescentou o segundo expositor, Carlos Eduardo Ruzyk, professor de Direito Civil e Processual Civil da Universidade Federal do Paraná, aqueles que buscam atender a seus interesses particulares ao custo dos da maioria, deixam de atender ao princípio da boa fé, um valor tão caro ao Direito.
Se por um lado não restam dúvidas quanto ao fato de que direito adquirido só existe na prática a partir da elegibilidade ao benefício, Daniel Pulino admitiu que por outro lado não é tarefa fácil casar essa certeza com o reconhecimento na lei do direito acumulado e individual de cada participante.
Pulino começou fazendo um histórico, para reforçar conceitos. Iniciou lembrando que a reforma constitucional de 1998 deu autonomia à previdência complementar fechada, reforçando a sua liberdade em 3 esferas, a contratual, associativa e de representação. Desse modo recepcionado no ambiente contratual, o nosso sistema se viu um pouco menos dependente do ato estatal, uma vez que muito mais valorizado passou a ser o compromisso expresso na assinatura do contrato, geralmente entendida no regime contratual como consolidadora de direitos.
Apesar desse encaminhamento, o tratamento legal e jurisprudencial, explicou Pulino, deu ao nosso sistema um tratamento diferenciado, não colocando o momento da assinatura do contrato como de aquisição de direitos.
Houve tempo, completou Ruzyk, em que a “vontade” expressa na assinatura do contrato se impunha, mas hoje é entendida como um ato praticado na origem mas sem a mesma força. E uma das razões disso é que ao assinar as pessoas de fato não fizeram uma escolha consciente quanto às cláusulas presentes no documento. “O que vale hoje é a boa fé objetiva no relacionamento com o plano”, resumiu Ruzyk, que completou: e essa boa fé está ausente na atitude das pessoas que buscam rever o valor dos benefícios sem ter razões para isso e ao preço dos interesses dos demais participantes.
Mesmo fora do prazo – Expositora na plenária sobre a “Responsabilidade Administrativa na Previdência Complementar”, Maria Sylvia di Pietro, professora de Direito Administrativo do Programa de Pós-Graduação em Direito da USP, fez uma apresentação didática e recheada de orientações. Depois de explicar que a responsabilidade administrativa se fundamenta na Lei Complementar 109, apoiada subsidiariamente na Lei 9.784/99, que dispõe sobre o processo administrativo, Maria Sylvia esclareceu que o fato de um recurso ser interposto fora do prazo não dispensa a autoridade de, se for o caso, rever a sua decisão anterior. “Tal revisão pode muito bem acontecer em nomes da legalidade e do princípio da auto tutela”, observou.
Além do recurso, há a possibilidade de revisão a qualquer tempo, desde que surjam fatos ou circunstâncias novas. Maria Sylvia disse ser isso consequência de que “o processo administrativo é mais flexível”. Há nele maior dose de informalidade, algo ausente, por exemplo, no processo judicial.
Ao final, recomendou aos advogados de entidades que permaneçam atentos às possibilidades oferecidas pela Lei 9.784/99 que, mesmo sendo subsidiária à Lei Complementar 109, pode se mostrar útil à resolução de problemas.
O expositor seguinte, Virgílio Antônio de Oliveira Filho, Procurador-Chefe da Procuradoria Federal da Previc, com muito didatismo expôs o que norteia a supervisão da responsabilidade administrativa, como os princípios da legalidade, ampla defesa e contraditório, impessoalidade, proporcionalidade, publicidade e eficiência, além da busca da real verdade. Ele explicou a estrutura e o funcionamento da Previc e Câmara de Recursos da Previdência Complementar – CRPC.
Quanto a esta última, apontou como uma das preocupações permanentes a individualização das condutas, “para que assim se possa separar o joio do trigo”.
“Até porque não se pode fazer o dirigente sentir medo na hora de decidir sobre um investimento”, comentou Virgílio, dando um motivo a mais para isso: “afinal, a nossa missão é atrair novos dirigentes e fomentar o sistema”.
Fonte: Diário da Previdência Complementar Fechada